sábado, 31 de julho de 2010

Comentando... 2ª Parte

Esta semana estivemos às voltas com três posts:

- Tentação, de Clarice Lispector;
- Amor casual, um conto de minha autoria;
- Sedna, a mulher que se apaixonou por um cachorro, uma lenda esquimó.

Pulo de “Tentação” para “Amor Casual” e continuo a pensar em como aprendermos a usar esse amor, que nos é inato, de forma positiva.

Vejo a menina ruiva, daquele post, numa hipótese mais feliz, crescendo e percebendo que é cisne. Encontrando sua própria turma, orgulhosa de si mesma, assumindo idéias próprias. E se permitindo a aventura de agir fora de padrões pré-estabelecidos.
A menina ruiva esqueceu o basset que virou a esquina, entendeu que sua alma, às vezes, pede coisas que não estão em nenhum manual de boas maneiras, e não teme experimentar. Se aventura a assediar, a conquistar, talvez até a predar... Afinal, se pergunta: se homens são capazes de fazer isso com tanta naturalidade, por que não tentar? Vai que é bom... ;)

Lá vai a personagem de Amor Casual, cheia de vontade de viver algo exclusivamente sexual, lúdico, descomprometido. E descobre, ao final, que não é e nunca vai ser um basset ruivo, que dobra a esquina sem olhar pra trás. Que sua alma pede a aventura, e pode até tê-la, mas vai ser sempre uma alma de mulher, uma alma amorosa.
Mas... que bacana já saber administrar isso com menos medo, mais liberdade...
Porque, embora sejamos amor, é preciso que tenhamos consciência de que amor, em essência, É liberdade. E, de onde tiramos que esse amor tem que ser administrado por regras que não fomos nós que criamos?

Quem tem que ditar quem amamos, como amamos, porque amamos, é nossa alma, nosso coração.

Quando vivemos nosso amor de forma mais livre e desinteressada, sem nos importarmos com aqueles que querem regrar algo divino, sem usá-lo como instrumento de barganha para conseguir o que queremos, e sem exigir reciprocidade obrigatória, começamos a entender o que, de fato, é o amor.

continua...

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Comentando... 1ª Parte

Esta semana estivemos às voltas com três posts:

- Tentação, de Clarice Lispector;
- Amor casual, um conto de minha autoria;
- Sedna, a mulher que se apaixonou por um cachorro, uma lenda esquimó.

Estive relendo os três, e me emocionei ao perceber quanto se pode aprender com eles sobre a natureza feminina e, talvez, sobre a masculina também...

A garota ruiva de Clarice, típica patinha feia, imersa numa fragilidade momentânea, por não saber ainda o belo cisne em que se transformará, me fez pensar em todas nós, quando ainda imaturas. Garotas ruivas, gordas, magras demais, de pernas muito finas ou muito compridas, baixinhas, tímidas, inseguras... garotas fora do padrão estabelecido como ideal numa sociedade que dita até mesmo como deve ser a beleza. Garotas que ainda não se aceitam, mas que querem muito ser aceitas, que procuram o amor, que temem a rejeição.

Estamos, nessa fase em que ainda não nos descobrimos mulheres, à mercê de quem nos abane o rabo e nos ofereça uma gostosa lambida... E, como a menina vermelha, muitas vezes encontramos solução num basset ruivo. Desprevenido, acostumado, cachorro.
Muitas mulheres se sentem garotas ruivas soluçando ao sol das duas por toda uma vida. E, às vezes, também por toda uma vida, seguem se apaixonando por cachorros. Cachorros que, como o basset ruivo, se vão sem olhar uma só vez pra trás, mais fortes do que elas. E elas ali, apalermadas, vendo-os dobrar a esquina, sem saber exatamente o que fazer com o amor que lhes sobra nas mãos...

Canso de me deparar com lindas mulheres feitas, verdadeiros cisnes brancos, que se sentem patinhos feios ou meninas vermelhas, e sempre fico me perguntando o porquê disso.
Mulheres que aceitam homens que se esforçam para detonar sua auto-estima. Mulheres bonitas que toleram homens que exaltam qualidades de outras mulheres, mas que ficam cegos às suas. Mulheres que bancam as contas da casa, são frequentemente humilhadas e, ainda assim, se sentem dependentes de um homem...

Posso especular que, talvez, tenham nascido numa família que não era a sua, de fato. Talvez tenham tido relações parentais complicadas, pais ausentes, falta de orientação e carinho... e, talvez, tenham se defrontado vezes demais com fortes bassets ruivos.
O que fazer para que essas mulheres entrem em contato consigo mesmas, percebam o próprio valor, tomem posse da força que têm, e, em vez de serem vítimas desse excesso de amor que transborda de todas nós, o usem a seu favor?


continua...

terça-feira, 27 de julho de 2010

Muito temos ainda para falar, sobre a alma feminina...

Sobre os papéis que a mulher exerce...
De como ela exerce...
Papéis de filha, de mãe...
De nora, de sogra...
De irmã, de cunhada...

Papéis de dona da casa... de cozinheira, de faxineira...
Papéis de executiva, médica, professora... de todas as profissões

Mulheres que desafiam...
Mulheres dependentes, outras totalmente independentes
Mulheres que se separam e outras que não conseguem por mais que tentem...
Mulheres apaixonadas, sedutoras... que abandonam tudo por um amor...
Mulheres obstinadas... lutadoras...
Mulheres fiéis e outras nem tanto...

Na parábola da águia...
o dilema da mãe que promove o crescimento...
propondo o paradoxo do empurrar para voar...

"A águia empurrou gentilmente os filhotes para a beira do ninho. Seu coração trepidava com emoções conflitantes enquanto sentia a resistência deles. 'Por que será que a emoção de voar precisa começar com o medo de cair?' – pensou. Esta pergunta eterna estava sem resposta para ela.

Como na tradição da espécie, seu ninho localizava-se no alto de uma saliência, num rochedo escarpado. Abaixo, havia somente o ar para suportar as asas de cada um de seus filhotes. A despeito de seus medos, a águia sabia que era tempo. Sua missão materna estava praticamente terminada. Restava uma última tarefa: o empurrão. A águia reuniu coragem através de uma sabedoria inata. Enquanto os filhotes não descobrissem suas asas, não haveria objetivos em suas vidas. Enquanto não aprendessem a voar, não compreenderiam o privilégio de terem nascido águias. O empurrão era o maior presente que a águia-mãe tinha para dar-lhes, era seu supremo amor. E por isso, um a um, ela empurrou, e todos voaram."
(Autor desconhecido)

Por Suely Laitano Nassif

domingo, 25 de julho de 2010

SEDNA - A mulher que se apaixonou por um cachorro

Considerada como uma das narrativas sobre a origens da Deusa - Mãe, que deu origem a todos os animais marinhos… e que garante a sobrevivência dos povos do Polo Ártico.

A história da Mulher Esqueleto pertence ao ciclo das historias relacionadas a Sedna.
Nesta versão da lenda podemos analisar aspectos importantes do espírito feminino em sua expressividade sensivel:

"Sedna, uma bela jovem muito galanteada pelos jovens do povoado.
Nunca aceitava seus pretendentes - até que se apaixonou por um cachorro e com ele casou.
Os jovens pretendentes rejeitados ficaram raivosos e juntos resolveram levar a moça para o alto mar e a jogaram nas águas geladas.
Para se salvar, Sedna agarrou-se a lateral do barco, mas os homens obstinados em se desfazer dela, cortaram seus dedos para que ela morresse afogada.

Quando seus dedos caíram no mar, foram se transformando nas primeiras focas e outros seres marinhos enquanto o corpo de Sedna ia para o fundo, se transformando na Rainha dos Seres Marinhos.

Mesmo morta, ela se transforma e beneficia a todos. Com o passar dos tempos, pelo descuido continuado dos homens, ela reage. Sedna ofendida castiga os homens. Senhora de todos os animais ela prende todos os animais nas profundezas do oceano, impedindo os homens de pescar e caçar.

Ate que um homem bravo, com poderes de xamã, foi até o fundo do mar e penteou e desembaraçou seus cabelos. Agradecida, liberta os animais para que a humanidade possa se alimentar outra vez".
Quantos ensinamentos!


Por Suely Laitano Nassif

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Amor Casual

Havia fantasiado aquela situação por tanto tempo, e agora ia rolar. E como sempre, as coisas rolavam quando deixava de planejar... quando desencanava. Estava tão cheia de homens enrolados, se desgastara tanto com pretensos garanhões que na hora "h" saltavam fora, que o que viesse era lucro. Um homem que não tivesse medo de ir com ela pra cama já seria um herói. Todas as vezes que questionara isso claramente, as respostas haviam sido sempre evasivas. Medo? Medo de quê? - eles perguntavam, se fazendo de bobos. Tinha medo, sim, isso era inegável. Medo de não saber o que fazer, medo de não agradar, medo de não gostar, medo da própria performance deixar a desejar... O medo se sobrepujava a tudo: ao amor, ao tesão, à curiosidade... Só queria um pouco de carinho, será que isso era tão complicado? A cena de Um Lugar Chamado Notting Hill, em que Julia Roberts pedia a Hugh Grant que não esquecesse de que ela era apenas uma garota querendo ser amada voltava com frequência à sua mente. Estava uma perfeita Julia Roberts: uma garota querendo amor.

Agora conhecera alguém. Aparentava não ter medo de nada. Espontaneidade a toda prova. A questão da possível brochada parecia simplesmente não existir. Um primeiro contato e uma inegável química detonara um processo irreversível de "querotecomercomamaiorurgênciapossívelpeloamordedeus". Um telefonema atrás do outro. Pressa. Torpedos em profusão. Ansiedade, arrepios, expectativa... Mal dera tempo de raciocinar, e já sentira tudo. Talvez assim fosse melhor... nada de pensar, só sentir. Ia viver o agora, como vinha preconizando há um bom tempo... E o tão afamado sexo casual, que até então só parecia ser vivido pelas protagonistas do Sex and the City deixaria de ser tabu. Por que não? Era o que vinha se perguntando há tanto tempo a respeito disso, e de muitas outras coisas. Não tinha nada a perder... Se bem que, depois dessas reticências sempre havia um pequeno ponto de interrogação... Mas, se nunca fizesse, nunca saberia. Daria a cara a tapa, mas havia de quebrar esse encantamento.

Por uma questão de urgência mesclada à falta de tempo hábil, o primeiro encontro se deu, atabalhoadamente, dentro do carro dele, o que só foi possível graças a um insulfilm absurdamente fora dos padrões seguros. Com certeza, quando fossem pra algum lugar melhor, seria mais prudente ir com seu próprio carro... Se policiou pra não começar a raciocinar demais, e não pôr tudo a perder.

Depois de alguns longos segundos em que ele parecia ter sido acometido por alguma espécie de paralisia, olhando-a, com um sorriso de encantamento, ela o estimulou a beijá-la, perguntando-lhe se não era isso o que dissera, repetidas vezes, por celular, estar louco pra fazer. Ele avançou nela como um desidratado numa jarra d' água. Não só beijou. Beijou, lambeu, mordeu, chupou, apalpou... Deus do céu... foi o que ela pensou, imaginando que ele devia estar enfrentando uma seca pior do que a dela, talvez há mais tempo... coitadinho... Deixou, deixou sem reservas, em total abnegação.

Nos intervalos entre um abraço e uma futura mancha roxa, teve oportunidade de fazer algumas perguntas-chave. Quantos anos você tem? A constatação de que ele era quinze anos mais novo que ela a transformou, numa fração de segundos, em pedófila. De onde você é? A origem nordestina projetou, instantaneamente, em sua imaginação fértil, o quadro de uma vida de sofrimento. Pôde vê-lo, retirante, chegando a Sampa com a cara e a coragem, e, provavelmente, mal alimentado. Perninhas finas e bambas... E finalmente: você ainda tem mãe viva? Nooossa... saber que ficara órfão de mãe aos dois anos de idade foi o golpe fatal. Chegava a ser covardia... se pudesse, o adotaria ali, naquele exato instante. O levaria pra casa, lhe daria um pratinho de sopa quente, e o colocaria numa cama quentinha... Coitadinho...

Saiu do carro amarrotada, se recompôs rapidamente, ajeitou os cabelos desgrenhados e foi pra casa pensando. Pensando não. Sentindo. A pele dele era macia, a boca gostosa, o desespero estimulante. Até que isso podia ser bom...

O segundo encontro começou estapafúrdio. Ele vinha de dois plantões de doze horas, seguidos. Tivera apenas uma hora para descansar. O constrangimento dele por ser ela dirigindo não cabia dentro do carro. O lugar que ela escolhera, a dedo, pra que tudo desse certo, foi rejeitado por ele, cuja ansiedade parecia não permitir que se fosse a algum lugar além da esquina. Quando ela sugeriu à recepcionista que lhes oferecesse alguma cortesia, a aflição dele fez com que se arrependesse imediatamente, pois, a seus olhos, ela devia ter extrapolado todos os limites da ousadia.

Depois de uma inspeção prévia em todos os cantos do quarto, ela pediu uns minutos e entrou no banheiro. Tudo parecia meio fora de lugar e não tão limpo quanto deveria. Resolveu passar por cima e curtir o momento. Não era pra isso que estava ali?

Saiu do banheiro, já enrolada numa toalha, e o encontrou mais do que pronto. E, no primeiro abraço, já querendo mergulhar nela, ele soltou uma frase que de tão proibida para a ocasião lhe pareceu quase pornográfica: eu tô morreeendo de medo de gostar demais de você e você só me querer pra sexo.

Ela se liquidificou. Seu estado passou de sólido pra gasoso e seu corpo se transformou num instrumento de caridade. Faça, faça o que quiser... Ele devia ter uma vida tão dura, bem que merecia possuir uma mulher sem restrições, sem muita frescura... Era tão jovem, provavelmente nem devia ter muita experiência naquilo que estava fazendo... Tão viril e forte, tão desesperado e agressivo... Ela previu que estaria quebrada no dia seguinte.

Ele dormiu profundamente. Ela o abraçou e, embora não tivesse sono, acabou cochilando, embalada pela respiração forte provocada pela exaustão dele. Pela janela se percebia a tarde cair e uma chuva gostosa serviu de trilha sonora pra aquele momento tão diferente de tudo o que previra em suas malucas fantasias de mulher em abstinência. Olhou o corpo jovem dele, e viu que, ainda ressonando, ele estava de novo pronto. Sorriu. Brincou com ele. Ele reagiu de imediato, como se estivesse acordado o tempo todo. Era um garoto... Que a usasse, como bem quisesse... Havia pouco tempo agora. Logo ele teria que ir pra outro turno de seu trabalho tão sacrificado. Coitadinho...

Na volta, estavam calados e ele se preocupou em lhe perguntar se estava tudo bem. Ela assentiu, com um sorriso. Despediram-se com beijinhos na boca, como se fossem namorados. E ela o deixou, penalizada por não poder estar mais um pouco ao lado dele, talvez adoçando um pouquinho sua vida, que parecia ser tão dura...

De repente, percebeu que esquecera por completo de si mesma. Nem lembrara de seu próprio prazer, de suas carências, de seus desejos há tanto macerados... Ele não fora nada generoso com ela na cama... mas estava se sentindo agradecida. Ele lhe dera, de pronto, a experiência de que tanto precisava para conhecer um pouco mais sobre si mesma. O quê, por exemplo? - se perguntou, sorrindo. Numa primeira análise, que ainda podia ser muito desejada... E que, provavelmente, nunca saberia fazer sexo casual. Aliás, estava tendo a sensação de que acabara de inventar uma nova modalidade, da qual nunca ouvira falar: o amor casual. Casual, sim. Mas não sexo. Amor.



domingo, 18 de julho de 2010

Começando a estudar o Barba Azul

Olá!

Já que temos visto que se proliferam por aí Brunos e Mizaels e Mel Gibsons, é inevitável chegar à conclusão de que estudar o Barba Azul é imprescindível. Vamos começar?

Antes de apresentar o conto em si, vou propor que comecemos a pensar a respeito do assunto. Dessa forma, você amadurece e se abre para captar nele sua riqueza, e aproveitar suas lições.

Fiquei me perguntando como começar a conversa sobre esse tema, e decidi que minha abordagem começa por aqui: O Barba Azul Existe - e você precisa enxergá-lo.

Encaremos de frente: o mal existe, às vezes pode travestir-se de riqueza e amabilidade, e precisamos estar atentas para nos proteger dele! Temos que nos preparar para enfrentar esses monstros, sejam eles personagens do mundo ao nosso redor, sejam eles parte da nossa psique.

É claro que qualquer pessoa que esteja lendo este post já percebeu que o Barba Azul representa algo de mal. Clarissa, em Mulheres que Correm com os Lobos, o define como um verdadeiro potentado predatório, cuja intenção é nos destruir. Ele pode ser um parente ou conhecido seu, no mundo físico, mas ele também existe dentro de você. É um aspecto de sua psique que trabalha contra a sua natureza, e contra tudo o que for positivo: contra o desenvolvimento, contra a harmonia e contra o que for selvagem.

Ele "surge no meio dos planos mais significativos da alma, isola a mulher de sua natureza intuitiva e a faz sentir-se frágil diante da vida".

E, por que insisto em dizer que o Barba Azul existe, se, no mundo em que vivemos, a mídia privilegia a desgraça, e basta ligar a TV ou abrir o jornal para que o Mal seja cuspido na nossa cara? Será que você já não sabe disso? Pra que ficar estudando o Barba Azul, se são tantos os monstros da vida real, enclausurando famílias inteiras, estuprando as próprias filhas, jogando garotinhas pela janela, escravizando seres humanos, que essa idéia de que o mal existe, e de que precisamos estar preparadas pra nos proteger dele já deveria estar mais do que entranhada em nós.

Pergunto: está???

Estamos preparadas para, na presença do predador, detectá-lo, e combatê-lo? Estamos preparadas para detectar qual parte de nossa psique joga contra nós, e anular o efeito de suas cruéis investidas? Se não, por quê? Vamos pensar nisso.

Quero trabalhar aqui a irrefutável teoria de Clarissa, sobre a negação do Mal.

Qualquer mulher que já tenha parado para pensar na educação que recebeu e no que a sociedade demonstra esperar dela, percebeu que há uma mensagem que se repete, implícita ou explicitamente:

não veja, não tenha insight, não fale, não haja.

Clarissa chama isso de "introjeções sombrias que, para as mulheres, são objeto de controvérsia". Ou seja: você recebe essas mensagens a vida toda, acaba acreditando que são verdadeiras, e as incorpora em seu modo de ser.

Mas... sua mulher selvagem, sua alma, sabe que isso não está certo. O antídoto para o mal, a forma de expulsar o predador, é fazer exatamente o contrário. Clarissa nos aconselha:

"tente prestar atenção à sua voz interior; faça perguntas; seja curiosa; veja o que estiver vendo; ouça o que estiver ouvindo; e então aja com base no que sabe ser verdade."

Um conselho como este pode parecer estranho: veja o que estiver vendo, ouça o que estiver ouvindo. Não é até engraçado? Não!!! Não é engraçado! É muuuito triste. O fato é que somos treinadas, desde crianças, a não ver o que estamos vendo, não ouvir o que estamos ouvindo. Aprendemos, desde cedo, a dourar a pílula. Amenizar as situações. Esconder o que é feio. Usamos eufemismos, palavras à meia-boca, expressões de constrangimento, e varremos a sujeira pra debaixo do tapete. Tanto fingimos não ver o que estamos vendo, que acabamos nos convencendo de que aquilo que estamos vendo realmente não existe. Complicado, não? Nem tanto.

Quem já não mordeu a língua para não chamar de agiota aquele conhecido que vive de emprestar dinheiro a juros extorsivos, porque seria ofensivo? Na nossa sociedade, é falta de educação ou preconceito (veja só!) chamar o gordo de gordo, o careca de careca, o pobre de pobre, o negro de negro, o velho de velho... Ou seja: não podemos dar nomes aos bois, porque é feio.
Temos muito acesso à informação, mas quando os problemas estão muito perto de nós, há uma enoorme dificuldade em se falar abertamente sobre eles.

Infelizmente, ficamos sabendo, a todo momento, de casos e mais casos de famílias inteiras acobertando todo tipo de loucura. Pais pedófilos, que abusam por anos a fio dos próprios filhos, sem que isso venha à tona; alcoólatras que nem ao menos percebem que são alcoólatras, porque ninguém tem coragem de falar sobre isso; mulheres que apanham frequentemente, e que não conseguem pedir ajuda a ninguém; pessoas doentes, que não têm coragem de se assumir doentes... Tanta coisa...

A impressão que tenho é de que se aprende, desde cedo, que quando a coisa parece ser muito feia, melhor fingir que nada aconteceu.

E posso dizer que, se cada um de nós começar a pensar na própria vida, vai encontrar inúmeras situações em que a conclusão a que chegamos foi essa.

Você lembra de algo assim em sua vida? Alguma coisa que foi tão abafada por todos ao seu redor, que você chegou à conclusão de que o melhor a fazer seria fingir não ter visto, não ter ouvido, e não falar nada?

Será que, de tanto passar por isso, você não introjetou essa idéia de não enxergar o que é muito feio ou ruim? De negar a realidade? Pense nisso. E me conte. Abra os olhos e veja, de verdade, o mundo ao seu redor.

Escrever sobre isso me fez lembrar dos três macaquinhos da lenda dos três macacos sábios. Você conhece? Vamos falar sobre ela numa próxima oportunidade!

Vou ficar por aqui, esperando seus relatos de "negação da realidade". Quero muito que vocês se dêem ao trabalho de relatar seus próprios casos, e fazer suas próprias reflexões.

Vou esperar por isso! Trocando, aprendemos!

Beeeijos!!! :)
Analú

quinta-feira, 15 de julho de 2010

A Tentação de Clarice Lispector

Ela estava com soluço. E como se não bastasse a claridade das duas horas, ela era ruiva.

Na rua vazia as pedras vibravam de calor - a cabeça da menina flamejava. Sentada nos degraus de sua casa, ela suportava. Ninguém na rua, só uma pessoa esperando inutilmente no ponto de bonde. E como se não bastasse seu olhar submisso e paciente, o soluço, a interrompia de momento a momento, abalando o queixo que se apoiava conformado na mão. Que fazer de uma menina ruiva com soluço? Olhamo-nos sem palavras, desalento contra desalento. Na rua deserta nenhum sinal de bonde. Numa terra de morenos, ser ruivo era uma revolta involuntária. Que importava se num dia futuro sua marca ia fazê-la erguer insolente uma cabeça de mulher ? Por enquanto ela estava sentada num degrau faiscante da porta, às duas horas. O que a salvava era uma bolsa velha de senhora, com alça partida. Segurava-a com um amor conjugal já habituado, apertando-a contra os joelhos.

Foi quando se aproximou a sua outra metade neste mundo, um irmão do Grajaú. A possibilidade de comunicação surgiu no ângulo quente da esquina, acompanhando uma senhora, e encarnado na figura de um cão. Era um basset lindo e miserável, doce sob a sua fatalidade. Era um basset ruivo.

Lá vinha ele trotando, à frente de sua dona, arrastando seu comprimento. Desprevenido, acostumado, cachorro.
A menina abriu os olhos pasmados. Suavemente avisado, o cachorro estacou diante dela. Sua língua vibrava. Ambos se olhavam.

Entre tantos seres que estão prontos para se tornarem donos de outro ser, lá estava a menina que viera ao mundo para ter aquele cachorro. Ele fremia suavemente, sem latir. Ela olhava-o sob os cabelos, fascinada, séria. Quanto tempo se passava ? Um grande soluço sacudiu-a desafinado. Ele nem sequer tremeu. Também ela passou por cima do soluço e continuou a fitá-lo.

Os pêlos de ambos eram curtos, vermelhos.
Que foi que se disseram? Não se sabe. Sabe-se apenas que se comunicaram rapidamente, pois não havia tempo. Sabe-se também que sem falar eles se pediam. Pediam-se, com urgência, com encabulamento, surpreendidos.

No meio de tanta vaga impossibilidade e de tanto sol, ali estava a solução para a criança vermelha. E no meio de tantas ruas a serem trotadas, de tantos cães maiores, de tantos esgotos secos - lá estava uma menina, como se fora carne de sua ruiva carne. Eles se fitavam profundos, entregues, ausentes de Grajaú. Mais um instante e o suspenso sonho se quebraria, cedendo talvez à gravidade com que se pediam.

Mas ambos eram comprometidos.
Ela com sua infância impossível, o centro da inocência que só se abriria quando ele fosse uma mulher. Ele, com sua natureza aprisionada.
A dona esperava impaciente sob o guarda-sol. O basset ruivo afinal despregou-se da menina e saiu sonâmbulo. Ela ficou espantada, com o acontecimento nas mãos, numa mudez que nem pai nem mãe compreendiam. Acompanhou-os com os olhos pretos que mal acreditavam, debruçada sobre a bolsa e os joelhos, até vê-lo dobrar a outra esquina.
Mas ele foi mais forte que ela. Nem uma só vez olhou para trás.


Por Suely Laitano Nassif

terça-feira, 13 de julho de 2010

Só 20 minutos...

O espelho reflete uma silhueta pálida, cansada. Um corpo imóvel, relaxado, branco. Longos cabelos negros, chegando à cintura, parecem pesar demais para o pescoço tão fino. Os seios fartos, de bicos muito grandes, cheios de leite. O ventre ainda inchado. Ela se olha, quase sem se ver. Não a agrada a própria aparência. Suspira. Liga o chuveiro, rapidamente. Entra no banho. A água lhe alivia o cansaço. Fecha os olhos, sente os pingos nos lábios. Serão vinte minutos.

Vinte minutos pra si mesma. Nem pode crer. Ainda não relaxou de todo, esperando qualquer chamado. Habituou-se... Esses minutos devem ser aproveitados, curtidos. Muito xampu, condicionador, sabonete perfumado. Vai fingir que não escuta o marido chamar, o filho maior batendo à porta, o bebê chorando. Que se virem. Ao menos por vinte minutos num dia...

Abre totalmente a torneira, sentindo no peito o jato frio. Arrepia-se. Fecha, e sai pingando pelo banheiro. Enrola os cabelos numa toalha, joga outra atrás do pescoço. Sente o hidratante umedecendo o corpo todo. Está com a barriga flácida, a pele ainda ressentida da gravidez. Ficou imensa... Ouve o choro do pequeno, ao longe. Quase hora de mamar... Podiam pegá-lo, ao menos. A panela de pressão faz um barulho enorme... Será que ninguém sabe que é preciso abaixar o fogo?

Passa o largo pente de madeira pelos fios negros, ensopados. O espelho agora reflete uma palidez limpa, e isso a agrada mais. Já tem a expressão mais descansada, ensaia sorrir de prazer. Está fresca. De um frescor que durará apenas alguns minutos, mas tudo bem. Passa um brilho rosado nos lábios, e faz biquinho, flertando consigo mesma. A TV está ligada no volume máximo. Será que são surdos? É o programa de esportes. O telefone toca insistentemente. O marido grita ao filho que atenda. - É pra mãe! - Assim fica impossível se alienar...

Está pronta, e passaram-se apenas quinze dos vinte minutos com que se presenteia todo dia. Que fazer dos outros cinco? Não deve desperdiçá-los. Olha em volta, não há livro algum pra ler. Senta sobre a tampa do vaso sanitário, encosta a cabeça no azulejo frio. Fecha os olhos. Conta até sessenta. Mais uma vez. E mais uma. Faltam só dois minutos. Cochila. Acorda, sobressaltada. Batem à porta. - Tem roupa pro tintureiro? Ergue-se, assustada. - Não!

Seus vinte minutos se foram. É o limite. Mais que isso, seria luxo excessivo. Nem tem tempo de abrir a porta, porque o marido já o fez. Tem o hábito de abri-la por fora, com a chave do carro. Tão respeitador... O filho despenca banheiro adentro, desesperado pra fazer xixi. O bebê chora. Ela corre, pra lhe pegar. Se veste rapidamente. Dispensa o tintureiro. Desliga o fogo. Tira o fone do gancho. Senta-se em frente à TV, e coloca o bebê no peito. E tenta ainda se manter um pouco alienada, enquanto o bebê mama e o marido, inconsolável, lhe pergunta - "Por quê?, meu Deus! Por quê tem que demorar tanto no banho?"

O que responder?...

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Nos braços do amado

Jalal ud-Din Rumi
Poeta e místico sufi do século XIII
(En Brazos Del Amado - Antologia De Poemas Misticos - Edição/reimpressão: 1998)

Sinopse: Las relaciones amorosas como camino de sanación. Pocas personas son conscientes del enorme poder que tienen las relaciones personales como vehículo para sanación mutua, física, emocional y espiritual. O del poder del "verdadero corazón" para despertarnos del trance emocional que a veces inducen las relaciones. O de las posibilidades que existen de llegar a ver a nuestra persona amada como "el Amado".


Por Suely Laitano Nassif

domingo, 11 de julho de 2010

A "Trivialização da Violência", ou "O Aprendizado da Impotência"

Olá! :)

Em Mulheres que Correm com os Lobos, Clarissa Pinkola Estés conta:

"No início da década de 1960, alguns cientistas realizaram experiências com animais para tentar determinar algo a respeito do "instinto de fuga" nos seres humanos.
Numa das experiências, eles fizeram uma instalação elétrica na metade direita de uma grande jaula, de modo que um cão preso nela recebesse um choque cada vez que pisasse no lado direito. O cão aprendeu rapidamente a permanecer no lado esquerdo da jaula.
Em seguida, o lado esquerdo da jaula recebeu o mesmo tipo de instalação, que foi desligada no lado direito. O cão logo se reorientou, aprendendo a ficar no lado direito da jaula. Então, todo o piso da gaiola foi preparado para dar choques aleatórios, de tal modo que, onde quer que o cão estivesse parado ou deitado, ele acabaria levando um choque.

Ele, a princípio, aparentou estar confuso e depois entrou em pânico. Finalmente, o cão desistiu e se deitou, aceitando os choques à medida que surgissem, sem tentar fugir deles ou descobrir de onde viriam. No entanto, a experiência não estava encerrada. No próximo passo, a jaula foi aberta.
Os cientistas esperavam que o cão saísse dali correndo, mas ele não fugiu. Muito embora pudesse abandonar a jaula quando bem entendesse, ele ficou ali deitado recebendo os choques aleatórios.

A partir dessa experiência, os cientistas levantaram a hipótese de que, quando um animal é exposto à violência, ele apresentará a tendência a se adaptar a essa perturbação, de tal forma que, quando a violência pára ou ele tem acesso à liberdade, o instinto saudável de fugir é extremamente reduzido, e em vez de escapar, o animal fica paralisado.

Em termos da natureza selvagem das mulheres, é essa trivialização da violência, assim como o que os cientistas subsequentemente denominaram aprendizado da impotência, que não só influencia as mulheres a ficar com parceiros alcoólatras, patrões exploradores e grupos que se aproveitam delas e as importunam, mas também faz com que elas se sintam incapazes de se erguer para apoiar aquilo em que acreditam profundamente: sua arte, seu amor, seu estilo de vida, sua preferência política."

Pergunto: Você acha que perdeu seu poder de lutar pelos elementos da alma e da vida que mais valoriza?

Vamos conversar sobre isso? Se não tivermos coragem para falar sobre essas questões, elas jamais se resolverão...

Beeeijos!!! :)

Cotidiano




Sonhe com aquilo que você quiser...



Suely Laitano Nassif

Caso Bruno - Não tem como não falar sobre isso

Essa semana foi a semana da barbárie... todo mundo já ouviu demais, todo mundo já se horrorizou e já se saturou... Mas, não tem como não falar sobre isso...
Eu fico me perguntando como é que essas pessoas conseguem viver em sociedade, trabalhar, desempenhar funções, crescer na vida... sem que ninguém perceba que há algo erraaado!!!!!!!!

Peloamordedeus, aquela promotora que quase matou a menininha que havia adotado, a loucura dela está no rosto, dá pra se fotografar... como é que ela trabalhava, entre gente “normal”, e nessa área!!! E ninguém captava nada de errado??????

No caso do Bruno, estamos vendo isso agora, que os holofotes estão sobre ele... mas, será que quem convivia com ele não percebia, o tempo todo, o quanto ele era perigoso?
Será que a sociedade fica cega a essas coisas de forma consciente? Será que o fato do cara ter dinheiro faz com que todos aceitem tudo, e não tenham coragem de se manifestar? Se temos amigos, os amigos não nos alertam quando estamos errando?
Ou não existem amigos?????????

E o que faz uma mulher seguir vida afora com comportamentos perigosos, que colocam em risco sua integridade física e moral, se relacionando com gente perigosa, encasquetando que um certo perfil de homem vá preenchê-la, suprir suas carências??? Ela cismava com jogadores de futebol desde pequena... :(
Eu fico abilolada...

Estou pra escrever sobre o Barba Azul e andei protelando, porque o assunto é pesado... Barba Azul, não sei se vocês conhecem a fábula, é um monstro que mata suas esposas, decapita e joga suas cabeças num quartinho... é a representação do homem que suga a mulher até deixá-la só o pó, e também dos predadores que temos dentro de nós mesmos, que agem contra nós.

Por conta desse Bruno, hoje PRECISO me dedicar a esse post... não vou ficar falando do jogador, porque esse assunto já está causando engulhos em todos nós... mas vou me empenhar para começar a trabalhar formas de aprendermos a lidar com esses monstros que nos habitam, e que nos rodeiam, na vida real.
Nooossa, como esse trabalho é necessário... Eu vou escrever sobre isso, e gostaria muito que as pessoas comentassem pra se começar um movimento de conscientização, porque não é possível que a sociedade alimente esses monstros, sem perceber o perigo latente...

E que a gente consiga, apesar do contexto, ter um fim de semana prolongado com um pouco de amor... estamos precisando muuito disso...

Beeijo!

sábado, 10 de julho de 2010

Hoje eu recebi flores!

TIPOS DE ABUSOS E VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER:

Violência física:
qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal.

Violência Psicológica:
Qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento. Ou ainda que vise controlar suas ações, e comportamento.

Violência Sexual:
A conduta que a constranja a presenciar, manter ou participar de relação sexual não desejada.

Violência Patrimonial:
A conduta que configure retenção ou subtração de seus objetos pessoais ou instrumentos de trabalho. Assim como recursos econômicos.

Violência Moral:
Qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injuria.


Suely Laitano Nassif

Trabalho sobre Violência contra a Mulher - Direitos Fundamentais

sexta-feira, 9 de julho de 2010

O Mito: Leila Diniz

Vamos falar sobre este controvertido tema: Mulher
Mulheres reprimidas, abusadas...
Mulheres ousadas, libertas...


Leila Roque Diniz
Nasceu em Niterói em 25 de março de 1945 e morreu em um acidente aéreo em Nova Délhi - Índia em 14 de junho de 1972.

Ipanema, 1971 - Leila Diniz é a primeira mulher famosa grávida a desfilar pelas areias cariocas usando biquíni: virou mito e criou moda copiada por estrelas do mundo inteiro.


"Sem discurso nem requerimento,
Leila Diniz soltou as mulheres de vinte
anos presas ao tronco de uma especial escravidão."


Carlos
Drummond
de Andrade


Por Suely Laitano Nassif