domingo, 11 de julho de 2010

A "Trivialização da Violência", ou "O Aprendizado da Impotência"

Olá! :)

Em Mulheres que Correm com os Lobos, Clarissa Pinkola Estés conta:

"No início da década de 1960, alguns cientistas realizaram experiências com animais para tentar determinar algo a respeito do "instinto de fuga" nos seres humanos.
Numa das experiências, eles fizeram uma instalação elétrica na metade direita de uma grande jaula, de modo que um cão preso nela recebesse um choque cada vez que pisasse no lado direito. O cão aprendeu rapidamente a permanecer no lado esquerdo da jaula.
Em seguida, o lado esquerdo da jaula recebeu o mesmo tipo de instalação, que foi desligada no lado direito. O cão logo se reorientou, aprendendo a ficar no lado direito da jaula. Então, todo o piso da gaiola foi preparado para dar choques aleatórios, de tal modo que, onde quer que o cão estivesse parado ou deitado, ele acabaria levando um choque.

Ele, a princípio, aparentou estar confuso e depois entrou em pânico. Finalmente, o cão desistiu e se deitou, aceitando os choques à medida que surgissem, sem tentar fugir deles ou descobrir de onde viriam. No entanto, a experiência não estava encerrada. No próximo passo, a jaula foi aberta.
Os cientistas esperavam que o cão saísse dali correndo, mas ele não fugiu. Muito embora pudesse abandonar a jaula quando bem entendesse, ele ficou ali deitado recebendo os choques aleatórios.

A partir dessa experiência, os cientistas levantaram a hipótese de que, quando um animal é exposto à violência, ele apresentará a tendência a se adaptar a essa perturbação, de tal forma que, quando a violência pára ou ele tem acesso à liberdade, o instinto saudável de fugir é extremamente reduzido, e em vez de escapar, o animal fica paralisado.

Em termos da natureza selvagem das mulheres, é essa trivialização da violência, assim como o que os cientistas subsequentemente denominaram aprendizado da impotência, que não só influencia as mulheres a ficar com parceiros alcoólatras, patrões exploradores e grupos que se aproveitam delas e as importunam, mas também faz com que elas se sintam incapazes de se erguer para apoiar aquilo em que acreditam profundamente: sua arte, seu amor, seu estilo de vida, sua preferência política."

Pergunto: Você acha que perdeu seu poder de lutar pelos elementos da alma e da vida que mais valoriza?

Vamos conversar sobre isso? Se não tivermos coragem para falar sobre essas questões, elas jamais se resolverão...

Beeeijos!!! :)

2 comentários:

  1. Ana

    Que incrível esta citação da Clarisse!!!
    Este experimento e muitos outros semelhantes são muito comuns nos laboratórios de neurociência.

    Eles falam sobre o comportamento humano...
    sobre esse comportamento que muitas vezes identificamos de forma mais intensa nas mulheres e em grupos minoritários.

    Há mesmo muito a se falar sobre isso, uma vez que este é um comportamento com base neurofisiológica, portanto muito fortemente arraigado...
    além de ter reforço social.

    Deste modo,
    É preciso desenvolver um senso de consciência
    para que possamos lutar contra esses mecanismos de acomodação... de adaptação...
    que só tendem a perpetuar a violência.

    Suely Nassif

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  2. Oi, Ana Lúcia, aí vai uma crônica que escrevi que aborda, de alguma forma, a violência sofrida pela mulher. Nesse caso, nossa personagem teve a vida transformada pelos livros... Abraços. Galeno Amorim.

    Esmeralda A., drogada e prostituída

    Um dia Esmeralda se perdeu na vida. Viveu o pão que o diabo amassou: foi drogada, prostituída e quase que se alimentava, por anos a fio, só de bebida. Ela era um dos onze irmãos sobreviventes, de um total de 19, da miséria, fome, doenças e, sobretudo, da falta
    de horizonte da família que vivia em Nova Londrina, interior do Paraná.

    Aos cinco anos, a menina foi trabalhar como doméstica. Em troca de roupa, calçado e estudo. Mas a mãe, alcoólatra, era uma perdida na
    vida. Volta e meia pegava os filhos pelos braços e saia a pé por aí. Sem eira nem beira. Dormiam em praças e calçadas, comiam sobras
    encontradas no lixo.

    Com muito custo, Esmeralda ficou na escola até os 11 anos. Chegou a frequentar a Admissão, o curso que preparava os alunos para o
    antigo Ginásio. Mas a vida era dura e ela não pôde seguir adiante.

    Foi, só, para a cidade grande, atrás de ganhar a vida como doméstica.

    Lá, foi violentada.

    Trazida de volta pra casa, desta vez não conseguiu vencer foi o preconceito das pessoas. Passaram a dizer que ela ganhava a vida
    como prostituta na capital. Por muitos anos, Esmeralda viveria seu inferno aqui na terra, como ela diz.

    Até que um belo dia um livro foi parar em suas mãos. O título dele era Samuel Morris. Contava a história de um jovem africano e negro como ela. Sequestrado por tribos rivais e separado
    da família desde muito cedo, o menino fez várias descobertas e deu uma bela virada em sua vida.

    - Foi um livro que me trouxe de volta à vida – ela diz, convicta.

    Foi pra Rondônia e tentou voltar a estudar. Mas sua antiga escola havia se incendiado e ela teve que adiar um pouco mais seu sonho.
    Só em 2003 pegaria, finalmente, o diploma, num curso de alfabetização de jovens e adultos. E nunca mais deixou de ler. A bíblia, por exemplo, ela lê um pouquinho por dia.
    Só que dona Esmeralda Alexandre Alfonso não consegue esquecer o que os livros fizeram por ela. Por isso, aos 52 anos, ela decidiu virar
    uma missionária da leitura. No assentamento de negros quilombolas de Despraiado, em Candoi (PR), ela se ofereceu para ser agente voluntária de leitura. Se inscreveu no Arca das Letras, um programa do governo federal que já abriu 6 mil minibibliotecas no campo, e
    cuida, de graça, da bibliotequinha aberta no lugar.

    É o jeito, ela diz, com uma simplicidade cativante, de levar um pouco de luz a esse povo. No meio desse povo, estão os quatro
    filhos dela e das outras 57 famílias de descendentes de escravos que lá vivem do cultivo de feijão, soja e verdura.
    — Uma pessoa que lê consegue falar melhor e se expressar como se deve – ela pontifica, com a sabedoria e a experiência que a vida lhe deu.

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