sexta-feira, 17 de maio de 2013

Mitos e Flores



Desde os mais primórdios dos tempos que a beleza singular, colorida e aromática das flores ilaqueou e encantou os homens. Ainda hoje são usadas para seduzir, como gentileza ou em rituais funerários e de adeus.

Apreciadas pelas culturas antigas, as flores foram usadas para fazer parte de rituais de casamento, iniciação sexual, perfumes e oferendas aos deuses. 

Do encanto da beleza de algumas flores, surgiram lendas que persistem até os nossos dias. 
Era como se nas cores e na delicadeza das flores o homem pudesse aliviar as suas fatalidades. 

Na mitologia grega algumas tragédias e tristezas foram traduzidas na origem das mais belas flores. Elas muitas vezes surgiram do sangue e das lágrimas dos homens e dos deuses. 
Um sentimento de dor era mitigado na delicadeza de uma flor.



Jacinto e o Amor dos Deuses

O belo Jacinto trazia na sua sensualidade de mortal o poder da sedução que despertou a paixão do deus Apolo e de Zéfiro, deus e senhor dos ventos do oeste. Diante da corte dos dois deuses, Jacinto decidiu-se por Apolo, provocando a ira e o ciúme incontrolável de Zéfiro.
Jacinto tornara-se muito amado por Apolo, que passou a segui-lo onde quer que fosse. Corriam pelos campos sob os olhos invejosos de Zéfiro, desfilando sua paixão e corpos perfeitos. Numa tarde de brisa suave, os dois amantes se divertiam com o jogo de arremesso de disco. Apolo arremessou o disco no céu. Jacinto seguiu com os olhos extasiados o vôo daquele disco. Foi neste momento sublime que Zéfiro interviu, mudando a direção dos ventos, fazendo com que o disco arremessado por Apolo atingisse a fronte de Jacinto. Tão logo atingido, o belo Jacinto deu o seu último suspiro, caindo morto sobre os campos. Da sua fronte o sangue jorrou, manchando a terra.

Apolo correu em socorro do amante, tentou ainda ressuscitá-lo, mas nem os seus poderes imortais trouxeram o jovem à vida. Apolo abraçou-se ao corpo do amado. Sentia o tormento da culpa em seu ser imortal. Jurou ao amante que jamais seria esquecido por ele, que todas às vezes que tocasse a sua lira e murmurasse o seu canto, seria uma forma de homenageá-lo e de lembrá-lo. E do sangue de Jacinto que molhava o solo, o deus fez brotar uma flor que trazia o colorido mais belo que a púrpura tíria. Uma flor muito semelhante ao lírio, porém, roxa. Ela traduzia a saudade e o pesar de Apolo. A flor foi chamada de jacinto e renasce toda primavera para lembrar o destino e a beleza perdida de Jacinto.

A flor descrita em nada se parece com o jacinto moderno, talvez seja uma íris ou amor-perfeito. Mas o jacinto como flor ficou a ser o símbolo da dor e da culpa de Apolo. Ou da inveja e da paixão não correspondida de Zéfiro.


Narciso e a Imagem na Fonte

Narciso era filho do deus-rio Cefiso e da ninfa Liríope.


Quando nasceu, o adivinho Tirésias declarou que ele teria uma longa vida, desde que jamais contemplasse a própria figura. 

Contemplar a própria imagem na Grécia antiga era vista como agouro e má sorte. 

Narciso cresceu belo, orgulhoso e insensível aos sentimentos e às paixões que espertava. 


Desprezava a todos que lhe apareciam como pretendentes e seguia pela vida sem amar ninguém, quase inatingível pelos sentimentos. 


A ninfa Eco apaixonou-se por Narciso, mas só conseguiu do jovem a indiferença. 


Eco via na beleza do rapaz os traços de um deus como Apolo ou Dionísio. 
O seu amor não correspondido a faz definhar aos poucos, diante de uma fonte, aonde vai perdendo a voz e só gemendo e repetindo o nome de Narciso. 

Compadecidos, os deuses do Olimpo a transforma em uma rocha que quando por ali passava alguém e falava alto, ouvia o som da própria voz repetida algumas vezes pelo pela rocha que se torna Eco. 

A insensibilidade de Narciso faz com que seja amaldiçoado pela deusa Némesis, que o condena a se apaixonar perdidamente pela primeira pessoa que visse. 

Narciso debruçou-se diante da fonte de Eco para saciar a sede, ao ver o seu reflexo na água apaixona-se desesperadamente pelo que vê. 
A paixão pela imagem que jamais pode tocar leva-o à loucura. 
Passa o tempo todo debruçado sobre a fonte, a amar a si mesmo, sem nunca ser correspondido. Narciso deixa-se definhar diante da fonte, a olhar a sua imagem. Não come, não bebe, ama-se em desespero e reflexo. Vive o desalento de amar a si mesmo até que é transformado pelos deuses na bela flor de narciso. 


Do Sangue de Adônis as Belas Anêmonas

Cíniras, rei de Chipre, filho de Apolo, é um soberano amante da arte e o criador de vários instrumentos musicais, como a flauta. 



Após um banquete regado de muito vinho e música, o rei recolheu-se nos seus aposentos, totalmente embriagado. 
A filha Mirra, que nutria uma paixão pelo próprio pai, aproveita da sua embriaguez para viver este amor, deitando-se no leito do pai e com ele tendo uma noite de amor. 
No dia seguinte, já sóbrio, o rei percebe o ardil. Enfurecido tenta matar a filha, que foge para os bosques. 

É nos bosques que Mirra irá dar à luz àquele que se tornaria o homem mais belo de toda a Grécia, Adônis, filho incestuoso do amor que sentia pelo próprio pai.

Adônis é de uma beleza perfeita. 

Tão perfeita que atrai para si a paixão de Afrodite, a deusa do amor e da beleza. Nos braços do amante mortal, Afrodite vive dias de intensa e feliz paixão, despertando a fúria do seu amante, o deus Ares, senhor da guerra e da discórdia. 
Preterido pelo amor de um mortal, o deus vinga-se da amante, quando Adônis participa de uma caçada de javalis. 
Ares envia um javali enfurecido que ataca o jovem, ferindo-o mortalmente nas ancas. O sangue de Adônis mancha a erva verde. 

Afrodite corre em socorro do amante, mas já o encontra dilacerado e morto pelo javali. Do sangue do belo Adônis faz brotar as anêmonas, flores brancas e sem cor. 
A deusa que se tinha ferido ao correr entre as silvas, vê o próprio sangue respingar sobre as anêmonas, que se tingem de vermelhas. 
Da sua dor e do sangue do amado foi feita a anêmona, flor da tristeza e do consolo, de raríssima beleza e que floresce e vive por pouco tempo.


Outras Flores... Outras Lendas



Outra lenda envolve Héracles (Hércules), filho de Zeus e da mortal Alcmena. 

Ao nascer o herói não teria herdado a imortalidade do pai, Zeus sabia que se ele fosse amamentado com o leite da mulher, a deusa Hera, tornar-se-ia imortal. 
Assim, ordena a Hermes que leve Héracles junto ao seio de Hera, quando esta estivesse dormindo. Mas Héracles ao sugar o leite do seio da deusa, faz com tanta violência, que Hera desperta e o atira para longe. 
O leite derramado do seio da deusa espalha-se pelo céu, onde cria a Via Láctea e pela terra, onde nascem os lírios ou, em uma outra versão, a flor de lis. 

As papoulas surgiram das lágrimas da deusa da agricultura Deméter, ao ter a filha Perséfone raptada pelo senhor dos infernos, o deus Hades. 
Para amenizar a dor de Deméter, Zeus ordena que Perséfone volte à terra por seis meses e os outros seis meses reina nos infernos ao lado de Hades. 
Assim, quando a filha retorna na primavera, surgem as papoulas, belas e de duração meteórica, para alegrar a deusa da agricultura e das plantações. 
Seja qual for a lenda, a tragédia é sempre amenizada pela singularidade das flores. 
Lendas, como a de Narciso, tornaram-se clássicas e usadas até como forma de expressão da psicanálise do século XX . 
Estão sempre associadas à beleza humana perdida para a morte e para a tragédia, refletida na beleza perene das flores. 


Por Beth Miguez
Fonte: Jeocaz Lee-Meddi - VIRTUÁLIA - O Manifesto Digital



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